História da LAI
Além da Constituição Federal de 1988, a Lei Geral de Arquivos Públicos, publicada em 1991, também já previa o livre acesso a documentos guardados pelo governo, mas não estava estabelecido como seria o procedimento para que o cidadão pudesse exercer esse direito, o que, na prática, inviabilizava o efetivo acesso a dados públicos. Por isso, a publicação da Lei de Acesso à Informação (LAI), em 2011, é um marco para a transparência pública e o controle social no Brasil.
Pressão social
Em 2003, quando foi realizado o 1º Seminário Internacional sobre Direito de Acesso a Informações Públicas, a urgência de se regulamentar o direito de acesso a informações públicas no Brasil ganhou destaque em debates políticos e na imprensa brasileira[1]. A partir do evento, foi criado o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas[2], que reúne 24 entidades da sociedade civil e atualmente é coordenado pela Transparência Brasil.
A Controladoria-Geral da União (CGU) situa em 2005 o início das discussões sobre a LAI no Conselho de Transparência do governo federal. Em 2006, a CGU apresentou o primeiro anteprojeto sobre acesso à informação ao Conselho de Transparência[3]. Após o 2° Seminário Internacional sobre Direito de Acesso a Informações Públicas, em 2009, a Casa Civil da Presidência da República enviou à Câmara dos Deputados o PL 5228/2009[4], que deu início ao processo legislativo para a aprovação da Lei de Acesso à Informação.
Em 2010, o Brasil sofreu uma condenação da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso da Guerrilha do Araguaia[5], o que acabou servindo como impulso adicional para a discussão de uma regulamentação do acesso à informação no país. No caso Araguaia, a Corte entendeu que o governo brasileiro violava o direito a conhecer a verdade sobre o ocorrido na chamada Guerrilha do Araguaia, quando dezenas de militantes do Partido Comunista do Brasil (PC do B) foram mortos em operações militares clandestinas durante a ditadura militar.
"Com a Lei de Anistia em vigor no Brasil em 1979, os familiares destes mortos/desaparecidos, aguardaram por seus retornos. Como isto não ocorreu (por óbvio, pois estavam todos mortos), a partir de 1980, eles começaram a procurar por seus entes queridos e descobriram que a grande maioria deles havia desaparecido (sido morta) naquela região do Araguaia. Seus corpos jamais foram localizados", recupera o pesquisador Marcos José Pinto em artigo para a Revista Jus[6].
Avanços e retrocessos
Em 2011, o Senado Federal[7] aprovou o projeto da Lei de Acesso à Informação e o encaminhou para a sanção presidencial. A LAI foi sancionada em novembro de 2011 e passou a vigorar em maio de 2012. Quase uma década após a implementação da LAI, os desafios da transparência pública no Brasil ainda são muitos - e tem se intensificado. Em 2019, o então vice-presidente Hamilton Mourão tentou mudar essa norma por meio de um decreto[8], mas voltou atrás após manifestações da sociedade civil alertando para o risco de deturpar a classificação de documentos prevista na LAI[9].
Em março de 2020, em meio à crise sanitária provocada pela pandemia da Covid-19, o governo federal editou uma Medida Provisória (MP) que suspendia prazos estabelecidos na LAI para responder pedidos de informação[10]. A medida foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) dias depois, após pressão de parlamentares e organizações da sociedade civil[11].
Mesmo no que se refere às obrigações de transparência ativa, ou seja, itens de divulgação obrigatória sem necessidade de demanda por parte de cidadãos, diversos relatórios têm apontado falhas. O Índice de Transparência da Covid-19, promovido pela Open Knowledge Brasil, por exemplo, revelou como eram insatisfatórios dados de monitoramento da pandemia do novo coronavírus oferecidos por Estados, capitais e pelo governo federal[12]. Uma nota técnica assinada por 11 organizações do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, em dezembro de 2020, também enumerou uma série de problemas[13]. O mesmo se repetiu em dados socioambientais[14] e da Funai[15] em relatórios produzidos pelo projeto Achados e Pedidos.
O próprio governo, através de seus órgãos de controle interno, reconhece limitações no cumprimento da norma, como mostra o Painel da LAI mantido pela CGU[16], com dados sobre a quantidade de pedidos recebidos, respondidos e ignorados por cada órgão, prazos médios de resposta nas unidades e outras informações sobre o cumprimento das obrigações de transparência ativa e passiva. Já a Escala Brasil Transparente[17], também mantida pela CGU, apresenta rankings de Estados e municípios (capitais e outras cidades selecionadas por meio de sorteio eletrônico).
Ainda, há o desafio da popularização das ferramentas de transparência entre os cidadãos, o que é um dos propósitos da WikiLAI. Mesmo jornalistas, que pela natureza de seu ofício são profissionais interessados em obter dados públicos para reportagens, pouco utilizam esse recurso, como mostra pesquisa da Abraji: quase metade dos profissionais que responderam a pesquisa nunca fez um pedido de informação[18].
Pelos registros da CGU, de 16 de maio de 2012, quando a LAI entrou em vigor, até 16 de maio de 2021, quando a lei completou nove anos, o governo federal tinha recebido cerca de 1 milhão de pedidos feitos por 456,7 mil brasileiros, o que representa uma média de 2,2 pedidos por cidadão que usou o sistema. O dado, no entanto, reflete que apenas 0,2% da população brasileira já utilizou alguma vez o serviço de informação ao cidadão do governo federal em uma década.
Veja também
Referências externas
- ↑ https://www.abraji.org.br/noticias/pesquisa-aponta-alto-indice-de-jornalistas-que-nunca-fizeram-pedidos-de-acesso-a-informacao
- ↑ https://informacaopublica.org.br/
- ↑ https://www.gov.br/acessoainformacao/pt-br/assuntos/conheca-seu-direito/historico-da-lai
- ↑ https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=434566
- ↑ https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf
- ↑ https://jus.com.br/artigos/21291/a-condenacao-do-brasil-no-caso-da-guerrilha-do-araguaia-pela-corte-interamericana-de-direitos-humanos
- ↑ https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/96674
- ↑ https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/60344275
- ↑ https://artigo19.org/2019/01/24/decreto-que-amplia-cargos-que-podem-atribuir-sigilo-ultrasessecreto-a-informacao-publica-e-preocupante-e-contraria-a-lai/
- ↑ https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/03/24/medida-provisoria-suspende-prazos-de-respostas-via-lei-de-acesso-a-informacao
- ↑ https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/04/30/stf-confirma-decisao-que-impede-restricoes-na-lei-de-acesso-a-informacao
- ↑ https://www.ok.org.br/noticia/indice-de-transparencia-da-covid-19-mobilizou-sociedade-por-abertura-de-dados-em-2020-veja-balanco/
- ↑ https://fiquemsabendo.com.br/saude/retrocesso-transparencia-ministerio-saude/
- ↑ https://www.achadosepedidos.org.br/uploads/publicacoes/Imperio_da_Opacidade_Socioambiental.pdf
- ↑ https://fiquemsabendo.com.br/meio-ambiente/controle-social-funai/
- ↑ http://paineis.cgu.gov.br/lai/index.htm
- ↑ https://www.gov.br/cgu/pt-br/assuntos/transparencia-publica/escala-brasil-transparente
- ↑ https://www.abraji.org.br/noticias/pesquisa-aponta-alto-indice-de-jornalistas-que-nunca-fizeram-pedidos-de-acesso-a-informacao